0 A Outra Metade de Mim | Opinião
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Segunda Guerra Mundial
Corre o ano de 1944 quando as gémeas chegam a Auschwitz com a mãe e o avô. No seu novo mundo, Pearl e Stasha Zamorski refugiam-se nas suas naturezas idênticas, encontrando conforto na linguagem privada e nas brincadeiras partilhadas da infância. As meninas fazem parte da população de gémeos para experiências conhecida como o Zoo de Mengele e, como tal, conhecem privilégios e horrores desconhecidos dos outros. Começam a mudar, a ver-se extirpadas das personalidades que em tempos partilharam, as suas identidades são alteradas pelo peso da culpa e da dor. Nesse inverno, num concerto orquestrado por Mengele, Pearl desaparece.
Stasha sofre a perda da irmã, mas agarra-se à possibilidade de que ela continue viva. Quando o campo é libertado pelo Exército Vermelho, ela e o companheiro Feliks - um rapaz que jurou vingança depois da morte do seu gémeo - atravessam a Polónia, um país agora destruído. Não os detêm a fome, os ferimentos e o caos que os rodeia, motivados como estão em igual medida pelo perigo e pela esperança. Encontram no seu caminho aldeões hostis, membros da resistência judaica e outros refugiados como eles, e continuam a sua viagem incentivados pela ideia de que Mengele pode ser apanhado e trazido à justiça. À medida que os jovens sobreviventes descobrem o que aconteceu ao mundo, tentam imaginar um futuro nele.
Uma história extraordinária, contada numa voz que tem tanto de belo como de original, Mischling é um livro que desafia todas as expectativas, atravessando um dos momentos mais negros da história da humanidade para nos mostrar o caminho para a beleza, a ética e a esperança.
Autor: Affinity Konar
Editor: Bertrand Editora (Novembro, 2016)
Género: Romance
Páginas: 328
Original: Mischling (2016)
opinião
★★★★★
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Josef Mengele, médico, dedicou-se aos testes mais absurdamente cruéis e odiosos para satisfazer a sua própria curiosidade "científica". O seu "objecto" de estudo preferencial seriam os gémeos, seleccionando de entre o par um irmão para a deterioração, sofrimento e ruína enquanto o outro era "poupado". Mengele tinha também interesse em saber, em gémeos idênticos com ligações muito fortes, como cada irmão seria afectado pela separação. E é assim que Stasha e Pearl acabam por se perder uma da outra.
Agradou-me bastante que, mesmo sendo Mengele uma peça chave na vida destas irmãs, a autora tenha escolhido dar-lhe o mínimo de tempo de antena possível. Este não é um livro sobre Josef Mengele e as atrocidades que cometeu, mas sim um livro sobre as diferentes formas que as suas vítimas arranjaram para lidar com tamanho trauma.
Curiosa e imaginativa, Stasha acredita na habilidade do Mundo para se corrigir a si próprio através de simples atos de bondade. Valoriza mais a irmã do que a si própria, não sendo de estranhar que se sinta diminuída e perdida quando Pearl desaparece. Para restaurar a sua alma, Stasha compromete-se com a missão de tomar a de Mengele, vingando assim a irmã Pearl, cujo único poder que considera ainda possuir, contrariamente à irmã, é justamente o do perdão.
Ambas se tornam penosamente reais para o leitor.
Num sítio onde o bem não era permitido, encontramos ainda assim personagens que tentavam, de alguma forma, dar algum conforto e esperança; pessoas que, obrigadas a pactuar com os crimes aqui perpetrados e com a brutalidade estudada de Mengele, não queriam, compreensivelmente, o direito a um futuro quando tudo acabou. Encontramos também uma personagem, uma das minhas favoritas, Bruna, que não vê outro modo de ser generosa e bondosa senão escondendo estas virtudes, mascarando-as de defeitos. Encontramos ainda a resiliência, uma rebeldia inocente que não podemos deixar de admirar.
Cheio de momentos marcantes, a autora de A Outra Metade de Mim compensa a violência e a brutalidade do livro com um inesperado sentimento de esperança.
Após tantas despedidas, quando ter ainda uma família era coisa rara, quando a aproximação dos russos e o fim da guerra traz apenas novas incertezas e problemas nos primeiros tempos, quando "voltar" significa possivelmente regressar a uma casa que já não é a nossa, um país que já não nos pertence e bens materiais que são agora de outrem, quando o esforço de reintegração parece uma tarefa impossível, quando se sobrevive a um mal tão grande que não é sequer compreensível (não para uma pessoa mentalmente sã)... ainda assim, Konar consegue deixar uma nota de esperança no final do livro.
Gostei muito.
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