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0 A Avó e a Neve Russa | Opinião


Wook.pt - A Avó e a Neve Russa«As folhas caídas das árvores giram à minha volta com o vento, mas aperto mais o casaco, porque nem o vento nem as folhas-bailarinas me alegram com a melancolia, só me deixam ensopado em tristeza, como a chuva nos faz por vezes. Os homens não choram. Avanço. Os catos que vejo alinhados na rua voltam a ser árvores e a Babushka, deitada na cama de hospital, é uma criança que aumentou e encolheu.»

Babushka está doente. Esta russa idosa, emigrante no Canadá, sobreviveu ao acidente nuclear de Chernobyl. Esconde no peito a doença que a obriga a respirar a contratempo e lhe impõe uma tosse longa e larga e comprida e sem fim — um mal que a faz viver mergulhada nas memórias do seu passado luminoso, a neve pura da Rússia, recordação sob recordação.

Na fronteira com a realidade caminha o seu neto mais novo, de dez anos, um menino que não desiste de puxar o fio à meada e de tentar devolver a avó ao presente. Para ajudar Babushka, precisa de encontrar uma solução para os seus pulmões destruídos, sacos rasgados e quase vazios — mesmo que isso o obrigue a crescer de repente e partir em busca de uma planta milagrosa, o segredo que poderá salvar a família e completar a matriosca que só ele vê.

Narrado na primeira pessoa e escrito a partir da perspetiva de uma criança, A Avó e a Neve Russa é um livro feito da inocência e da coragem com que se veste o deslumbramento das infâncias. Romance simples e emotivo sobre a força da memória e da abnegação, relata a peregrinação de um neto através da esperança, do Canadá ao México, para encontrar a possibilidade de um final feliz.


Autor: João Reis
Editor: Elsinore (Fevereiro, 2017)
Género: Romance
Páginas: 224

opinião
★★★★☆
A Avó e a Neve Russa é o extraordinário relato, na primeira pessoa, da busca de um menino de 10 anos pela cura que poderá salvar a vida à sua avó, uma sobrevivente ao acidente nuclear de Chernobyl, emigrada no Canadá.

Ao contrário do que esperava, a minha parte preferida foi o acesso, sem reservas, à perspectiva directa desta criança. João Reis faz um extraordinário trabalho neste sentido, condimentando a narrativa com uma dose exacta de inocência e sabedora, coragem e esperança, humor e melancolia.

Relacionando-se com as mais diversas personagens, a curiosidade, interesse e genuína preocupação desta criança com os que o rodeiam e com o mundo em geral é visível em cada página do livro. É difícil não nos deixarmos encantar pelas suas palavras e raciocínios; é ainda mais difícil deixá-lo ficar para trás ao volver da última página. 


Frases Preferidas:
ISBN: 9789898843654
«às vezes, as pessoas estão desatentas, devido a estarem ocupadas com as rodas dentadas e os pêndulos da vida no capitalismo.» - 19

«terá de haver sempre lugar para idiotas numa sociedade multicultural» - 38


«o homem tem se se elevar, e só não acredita na transformação aquele que é demasiado comodista para se esforçar, ou aquele que, tendo consciência do seu estatuto na sociedade - seja ele qual for, cavalheiros -, pretende manter uma sociedade em que se apoia essa desigualdade que, de modo objetivo e responsável a nível ético, pode apenas ser encarada como perniciosa e injusta. Ignorar tal facto numa sociedade de informação  gradualmente mais globalizada é, no fundo, aceitar a barbárie, como quem vira a cara face ao sofrimento do seu semelhante.» - 189


João Reis é também autor de A Noiva do Tradutor




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