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0 As Altas Montanhas de Portugal | Opinião


Trás-os-Montes segundo Yann Martel.

Na Lisboa de 1904, um jovem chamado Tomás descobre um diário antigo onde é mencionado um artefacto extraordinário que poderá redefinir a história. Ao volante de um dos primeiros automóveis da Europa, Tomás aventura-se pelo país em busca deste objeto invulgar. Trinta e cinco anos depois, em Bragança, um patologista, leitor voraz dos romances de Agatha Christie, vê-se enredado num mistério que é consequência da demanda que Tomás levara a cabo. Décadas mais tarde, um senador canadiano refugia-se numa aldeia no Norte de Portugal após a morte da mulher. Com ele traz um companheiro invulgar: um chimpanzé. E eis que é desvendado por fim um mistério com cem anos. As Altas Montanhas de Portugal é um romance original e empolgante que explora com mestria questões prementes da condição humana. Cheio de humor e surpresas, leva-nos numa viagem pelo Portugal do século passado que é também uma viagem interior.

Do autor de A Vida de Pi, bestseller internacional vencedor do Man Booker Prize, estas 3 novelas interligadas que têm em comum o tema da perda, foram idealizadas pelo autor aos 20 anos.


Autor: Yann Martel 
Editor: Editorial Presença (Abril, 2016) 
Género: Romance
Páginas: -
Original: The High Mountains of Portugal (2016) 

opinião
★★★✩✩

Frouxamente relacionadas, as três secções que compõem As Altas Montanhas de Portugal variam não só em conteúdo e tom emocional mas também na própria qualidade. Não foi fácil valorizar o livro a partir da sua primeira parte; aliás a tentação de abandonar por completo a leitura tornou-se considerável. Há no entanto que dizer que, das três, esta primeira parte é a mais enérgica e que poderemos mesmo vir a sentir falta desta dinâmica no resto do livro, bem mais parado e pouco vigoroso. A segunda parte intrigou-me pela justaposição entre os Evangelhos e o trabalho literário de Agatha Christie, mas pouco mais para além disso. Foi na terceira parte, mais profunda e significativa, que me pareceu existir história que merecesse realmente ser contada pela sua dimensão emocional, moral e espiritual.

O livro, apesar da excelente prosa e capacidade descritiva, é enaltecido pelos mesmos elementos que o prejudicam tornando-se um misto intrigante/estimulante e confuso/aborrecido. Embora seja agradável que Yann Martel deixe muito à consideração do leitor, tanta ambiguidade chega a ser cansativa. Não é fácil confirmar e estabelecer a profundidade dos personagens, divisar o substancial do puramente absurdo e tentar inferir sobre os possíveis objectivos do escritor, mas não deixa, ao mesmo tempo, de ser interessante e desafiante procurar significado no meio de tanta bizarrice. Embora aprecie a implausibilidade que compõe algumas das cenas deste livro, carregado de simbolismo, não gostei da completa falta de lógica de outras, desvalorizando a intelectualidade do seu conteúdo.

Com humor e ironia, Martel toca em temas interessantes como a fé (religiosa, amorosa, política, …), a busca de casa (como local de identidade e segurança) a solidão, o isolamento e a dor, mas sem o ambiente melodramático que estamos habituados ver acompanhar qualquer noção de pesar e perda.

E chegamos assim à minha parte preferida, a terceira secção do livro, como já referi, onde é abordada a ligação entre o homem e o animal - onde me parece que a competência do escritor brilha finalmente com a intensidade merecida. Neste livro parece que Martel nos coloca no meio, entre os animais e o divino, ambos misteriosos, ambos com a capacidade de existir completa e exclusivamente no 'momento' enquanto nós nos deixamos atormentar entre as memórias do passado e as perspetivas do futuro. E quando olhamos para Odo e a assustadora semelhança genética que nos aproxima, não podemos deixar de questionar afinal o que fizemos nós com a nossa inteligência superior.

Fico-me pelas três estrelas porque, embora tenha gostado de procurar significado no surrealismo de Martel, se me questionar se gostei propriamente de ler o livro, a resposta mais honesta será: 'nem por isso…'.





Yann Martel é também autor de Beatriz e Virgílio e de A Vida de Pi.


Yann Martel’s ‘The High Mountains of Portugal’ is his best since ‘Life of Pi’ - The Washington Post

The moral and spiritual implications of his tale have, in the end, a quality of haunting tenderness. - The Guardian







Nascido em Espanha, em 1963, mas naturalizado canadiano, o Booker Prize vendeu mais de três milhões de cópias nos Estados Unidos, e viu A Vida de Pi ser publicada em 41 países e figurar como bestseller do New York Times por mais de um ano. A Vida de Pi foi o primeiro livro de Yann Martel a ser editado em Portugal pela Difel, em 2003. A partir de 2010, a Presença torna-se detentora dos direitos para publicação de Beatriz e Virgílio e A Vida de Pi.



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