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2 A Vida Secreta das Princesas Árabes

«Quando o normal é proibido, as pessoas caem no anormal.»

E assim é.

Pessoalmente, nada tenho contra qualquer religião nem tampouco me penso no direito de ter - mas condeno-as , a todas, quando colocam em perigo ou precarizam tantas vidas.

Condeno-as quando as vejo incutir tanta maldade e perversão num menino de nove anos (Ali - irmão de Sultana).

E ficam-me sempre estas questões: se não conseguem ouvir o riso de uma mulher sem se sentirem sexualmente excitados, como é o caso dos homens afegãos, ou olhar para a cara de uma mulher sem sentirem uma primitividade animal . não estará o dito pecado neles próprios? Porque haveriam as mulheres de ser as castigadas por tal?!

E quando homens permitem que o fervor religioso condene à morte ou a uma vida de maus tratos e subserviência as suas irmãs, esposas e filhas - não estará já cometido um pecado bem mais desumano?!

Na Arábia saudita, uma das nações mais ricas do mundo, cheia de opulentas riquezas, o valor de uma mulher é muito baixo - o nascimento de uma menina traz desgosto e vergonha para uma família e elas viverão apenas para serem «ignoradas pelos seus pais, desprezadas pelos irmãos e maltratadas pelos maridos». Não haverá registo do seu nascimento, tampouco da sua morte. Apenas uma existência de clausura, direcionada para o conforto e conveniência dos homens da sua vida.

Oprimidas pelas leis dos seus homens, estas mulheres não têm sequer a possibilidade de recorrer contra as injustiças cometidas contra elas. «A mera desconfiança de má conduta sexual, como um beijo, poderá decretar a morte de uma jovem».

Mas até mesmo nesta realidade tão comparativamente distante da nossa, há exceções. E a princesa Sultana é, certamente, uma delas!

Pertencente à sexta geração dos primeiros Emirados do Nadj, Sultana relata-nos nesta compilação de três livros («Sultana - A vida de Uma Princesa Árabe», «As Filhas da Princesa Sultana» e «Deserto Real») episódios reveladores sobre a cultura e costumes do seu país, bem como vários crimes (porque não há outro nome para estes atos) cometidos contra as mulheres, sob uma perversa satisfação masculina.

A escravidão sexual, a prática de excisão, o esbanjamento tresloucado de dinheiro que se observa em território saudita, a religião levada aos extremos da insanidade, a agressividade e violência patente no povo saudita são temas abordados por uma mulher corajosa e inteligente que, ainda que criada no seio destes costumes e devota a esta mesma religião, manteve intacta a sua humanidade e a capacidade de se sentir tão indignada quanto nós contra a condição da mulher na fé islâmica.
Uma vez que são três livros escritos (e sobre) períodos distintos, acompanhamos não só a vida e Sultana e da sua família ao longo de vários anos mas também os poucos e preciosos avanços na mentalidade árabe, bem como os marcantes conflitos políticos e confrontos armados.

As memórias de Sultana, de menina a mulher, mostram-nos que uma mulher com a sua inteligência, ousadia e persistência pode, de facto, fazer a diferença. Lamentavelmente, no segundo livro, Sultana perde um bocadinho do seu afinco crítico e chega aparecer que tenta redimir-se de algumas coisas proferidas no livro anterior, pondo um pouco de lado as críticas diretas e recorrendo mais ao simples relato. Felizmente, no terceiro livro, Sultana parece reencontrar-se.

Isto não é certamente elogio algum para a autora do livro, Jean Sasson, mas a leitura deste compensa apenas pela história - pela sua chocante veracidade. Na verdade, e não creio que sejam apenas problemas advindos da tradução, a construção de frases chega a ser bastante pobre e, não fosse o ritmo e familiaridade impostos por um relato na primeira pessoa, provavelmente, seria um livro penoso de ler. Mas como falamos de um livro biográfico e não de um romance, este aspeto pesou muito pouco na minha opinião.





Frases Preferidas:
«Quanto mais proibições tiverem, menos virtuosas serão as pessoas» (Tao Te Ching).
«Só os nossos próprios olhos chorarão por nós.» (Provérbio árabe)
«A tua língua é o teu cavalo e, se o deixares à solta, atraiçoar-te-á.» (Provérbio árabe)
«Porque razão haveria eu de ferver água? - perguntei num tom de escárnio. - Continuaria a não passar de água.»
«Os árabes ou estão aos teus pés ou sobre a tua garganta.» (Provérbio árabe)
«Até que o meu dia chegue, ninguém poderá fazer-me mal; quando o meu dia chegar, ninguém poderá salvar-me.»

Sinopse:
A Vida Secreta das Princesas ÁrabesSultana é o pseudónimo de uma corajosa princesa da Arábia Saudita. Ela é uma das dez filhas da família real mas a sua vida, rodeada de luxo e riquezas inimagináveis, está longe de ser um conto de fadas. No seu país, as mulheres - qualquer que seja o seu estrato social - estão sujeitas à tirania ditada por um fanatismo religioso que promove a poligamia, dá ao homem o poder de castigar cruelmente qualquer mulher e incentiva os casamentos forçados, as mutilações e a violência sexual, as execuções por apedrejamento ou afogamento. 
Quando aceitou contar a sua história à jornalista e escritora Jean Sasson, Sultana sabia que estava a pôr em risco a própria vida. Foi conscientemente que abdicou da sua segurança pessoal para denunciar o brutal quotidiano das mulheres sauditas. A sua voz dá-nos a conhecer um mundo no qual a sumptuosidade e a extravagância coexistem com a violência e a barbárie. A princesa partilha connosco a sua intimidade e a das mulheres que a rodeiam: as suas filhas, primas, amigas… mas, na sua franqueza e coragem, ela fala por todas as mulheres.


Este volume reúne os livros: 
Sultana - A Vida de uma Princesa Árabe
As Filhas da Princesa Sultana
Deserto Real

Autor: Jean Sasson
Editor: Edições ASA (2012)
Páginas: 624
    



✏ Livros de Jean Sasson publicados em Portugal:
     - Vítimas da Tradição (ASA, 2015)
     - A Escolha de Yasmeena (ASA, 2014)
     - A Vida Secreta das Princesas Árabes (ASA, 2012);
     - A Minha Vida com Osama Bin Laden (ASA, 2010)
     - Amor em Terra de Chamas (ASA, 2010)
     - O Filho de Ester (ASA, 2006)

      


2 comentários:

  1. E incrivél que em 2014 uma mulher não tenha bilhete de identidade....
    E um ser Humano.....

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  2. Como pode,Mulher ser tao rebaixada.
    Mulheres tem mesmo direito de ir e vir.ela tem o mesmo direito de ser uma simple dona de casa ou ser presidente.

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