0 Um Natal | Opinião
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4 estrelas,
Contos,
Truman Capote
Este curto texto lembra-nos que Truman Capote também em alguns dos seus livros (A Harpa de Ervas, por exemplo) foi um poeta da prosa que punha em cena jovens inquietos e difíceis com pouca vontade de crescer.
Aqui, é uma criança que fala. Um rapazinho, filho de pais separados e educado por uma velha prima, vê-se obrigado a passar o Natal com o pai, em Nova Orleães, onde espera ver finalmente a neve. Mas não há neve nem milagres junto de um homem rodeado de mulheres que procura exprimir uma ternura que o rapazinho compreende mal.
Encontro falhado e tanto mais doloroso quanto foi vivido com uma espécie de doçura tão implacável como a violência. Truman Capote nunca levanta a voz para nos falar dessa perturbação íntima. Para descrever algo tão secreto como um desgosto infantil, a densidade e a emoção contida destas páginas são a mais perfeita das realizações.
Autor: Truman Capote
Editor: Difel
Género: Conto
Páginas: 28
Original: One Christmas (1982)
Opinião
★★★★✰
Truman Capote é um daqueles escritores que, dizendo pouco, nos diz tanto.
Aqui é-nos narrado, na primeira pessoa, o episódio em que, na infância, Capote foi passar o Natal com o pai enquanto cede, simultaneamente, indicações do que aconteceu posteriormente, anos mais tarde.
O casamento dos seus pais é um daqueles que nunca deveria ter acontecido; quando decidiram finalmente seguir cada um o seu caminho, deixaram o filho aos cuidados de familiares, nomeadamente uma tia à qual ele muito se afeiçoa.
É esta criança que nos fala directamente, criando um contraste formidável entre o peso do que nos é dito e a leveza com que essa informação é partilhada. Apesar do ponto de vista infantil, simples, minimalista, notamos no tanto que se esconde por detrás de cada frase. Mesmo que na altura não conseguisse compreender o que o rodeava, capote viria mais tarde a estudar estas peripécias, a analisá-las, a perceber como moldaram a sua personalidade, como o traumatizaram e fizeram sentir que o seu nascimento veio comprometer a vida dos pais. Sem explorar largamente os sentimentos dos personagens, Capote explicita o respectivo sofrimento, medo e raiva no comportamento de cada um deles, nas suas decisões e reacções.
"Todo o tempo que ela falou (e eu tentava não ouvir, porque ao dizer que o meu nascimento a tinha destruído, ela estava a destruir-me)" - p.19
Como é fácil de adivinhar, esta visita não corre pelo melhor. O pai exibe-o com orgulho sem se aperceber do embaraço que lhe provoca; não o conhece e, por isso mesmo, não o consegue agradar.
Curto e muito fácil de acompanhar, é bem provável que passemos mais tempo a pensar no livro depois de terminado do que propriamente a lê-lo.
"Senti uma dor estranhíssima. Uma dor esmagadora que doía por todo o lado." - p. 26
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